Por Fabrício Brandão

Por Fabrício Brandão

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Da relação com o saber: elementos para uma teoria

CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Tradução: Bruno Magne. Porto Alegre: ARTMED, 2000.


Bernard Charlot, francês, Doutor em Ciências da Educação pela Universidade Paris X, Nanterre. Autor de várias obras, dentre as quais, “A mistificação pedagógica: realidades sociais e processos ideológicos na teoria da educação”, publicada no Brasil pela editora Zahar. Aborda em seu livro, “Da relação com o saber: elementos para uma teoria”, uma temática cada vez mais presente nas ciências humanas. No transcurso de suas páginas evidencia-se o vínculo possível entre o saber e o aprender. Vínculo que precisa ser compreendido se é desejo refletir sobre as verdadeiras causas do fracasso escolar.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Fracasso escolar e condição social

Considera-se que todo ser humano é capaz de aprender, não havendo, assim, vínculo direto entre essa capacidade e a condição social dos indivíduos. Na sua iminência, o que cabe à escola é compensar as diferenças de origem e estabelecer uma prática educativa que garanta o direito à aprendizagem. Atrelar o fracasso escolar às diferenças sociais é negar que o homem, por natureza, é predisposto a aprender. Posicionamentos contrários não mais que ratificariam o caráter ideológico que vincula a capacidade cognitiva à origem social. Portanto, é vazio o discurso que relaciona o desenvolvimento intelectual à classe que o indivíduo pertence. Tal fato só viria a justificar uma ação pedagógica que não considera as especificidades de cada um e não reconhece as possibilidades que se apresentam durante o desenrolar do processo educativo.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

A aprendizagem e sua relação com o conhecimento

A escola é uma instituição onde deve-se privilegiar a formação do indivíduo. Sua formação cognitiva e psicossocial. Não pode ser negado este amplo papel a ela, mesmo acreditando que o ser se forma continuamente ao longo da vida e em todas as circunstâncias. É a escola que possui condições para planejar, dirigir, sistematizar esta formação, tendo fins e objetivos definidos. Via de regra, para que ela seja atingida, é imprescindível o acesso ao conhecimento. A escola precisa possibilitar que as novas gerações tenham condições de se apropriar do saber que foi produzido socialmente. Não para repeti-lo mecanicamente, mas para compreendê-lo e torná-lo útil. Afinal, conhecer significa compreender o objeto de estudo nas suas múltiplas relações, considerando que o conhecimento vem justificar como a realidade se organiza dentro de um contexto dado, que é histórico.

A compreensão de tal fato torna-se essencial para que seja justificada a necessidade de se moldar, no interior da escola, um ambiente onde a apropriação do conhecimento pelo indivíduo seja, não só favorecida, como estimulada. Isto porque esta apropriação é fundamental para que a realidade a que ele está submetido seja compreendida e, posteriormente, transformada. Apropriar-se do conhecimento não significa memorizá-lo pura e simplesmente. Mas sim, torná-lo seu; com significações que são suas e que vem justificar necessidades que são inerentes ao ser. É preciso que sejam criadas condições para que o conhecimento seja realmente apropriado pelo educando em uma situação que o leve a produzi-lo em interação com seus iguais, sendo que isso só ocorrerá quando forem satisfeitas, a princípio, duas condições:

1. O conteúdo a ser objeto de estudo precisa ser significativo: Ele precisa estar vinculado a um outro conhecimento prévio que servirá de base para que ele se ancore. Se em sua estrutura cognitiva o educando não possuir nada que o remeta ao novo conhecimento que lhe está sendo apresentado, será muito difícil que ele permaneça nela. Isso porque a aprendizagem só acontece quando um conhecimento novo encontra dentro da estrutura cognitiva uma base que leve à sua compreensão. Aqui temos um princípio fundamental da “Aprendizagem Significativa”, de David Ausubel;
2. O conteúdo a ser objeto de estudo precisa satisfazer alguma necessidade do educando: Se o objeto de estudo não satisfizer nenhuma necessidade posta pela realidade social do educando, será muito difícil dele se interessar por ele. O objeto de estudo precisa, necessariamente, ir de encontro às necessidades reais de vida dos indivíduos, ele precisa sugestionar a possibilidade de compreensão da realidade para posterior ação. A reflexão sobre o real só será desencadeada a partir do momento que for de interesse do indivíduo, a partir do momento que brotar a necessidade por parte dele de debruçar-se sobre a realidade com o intuito de desvendá-la à procura das soluções dos seus problemas.

Pode-se dizer, então, que aprender é conhecer e que só se aprende quando a realidade é conhecida e apreendida pelo educando em suas múltiplas relações. É a relação direta com o real vinculado a um todo dinâmico que permitirá a produção do conhecimento e o desenvolvimento da aprendizagem. Será a partir desta relação que a realidade será ressignificada pelo sujeito, isto é, será compreendida por ele com suas especificidades fruto da sua ação. Delineia-se aqui o grande desafio da escola: possibilitar o contato efetivo entre o sujeito e a realidade como via possível para se garantir a aprendizagem. Outra alternativa poderá gerar não mais do que uma apropriação mecânica, memorística e superficial daqueles conteúdos que estão listados em um programa curricular.

Assim, para ter ampliada a sua capacidade de compreensão e análise acerca do movimento que envolve o real, o educando necessita ter a sua atenção voltada para o ato de conhecer/aprender. Precisa estar disposto a confrontar-se com os objetos que compõem a realidade e com as múltiplas relações históricas, econômicas, políticas e sociais que possam estar materializadas em sua configuração, sendo função da escola a adoção de atitudes que irão favorecer o desenvolvimento desta disposição, tais como:

1. Contribuir para que aflore o desejo por conhecer/aprender. Aqui reside a necessidade de se deixar aflorar o querer. O ato de aprender está vinculado diretamente ao desejo, à vontade, à necessidade;
2. Partir daquilo que é significativo. Daquilo que pode ser assimilado pela estrutura cognitiva;
3. Possibilitar o confronto entre o sujeito e o objeto. O conhecimento se dá através da ação;
4. Causar desequilíbrios cognitivos que promovam saltos qualitativos na aprendizagem. Este desequilíbrio poderá ser atingido pela contradição estabelecida entre a imagem que o indivíduo faz do objeto e sua real configuração. Tal feito poderá ser atingido através de atividades problematizadoras;
5. Relacionar aquilo que está sendo objeto de estudo à prática social. O conhecimento não pode estar desvinculado da realidade social vigente;
6. Oferecer atividades diversificadas e atrativas que possam auxiliar no ato de se conhecer o objeto de estudo;
7. Estimular o confronto de idéias. Criar um ambiente onde seja favorecida a participação coletiva no ato de se produzir o conhecimento. Afinal, o desenvolvimento da linguagem/comunicação é fundamental para a organização do pensamento.

Por fim, é necessário se ter consciência de que o ato de conhecer/aprender não envolve só disposição, mas também uma verdadeira mobilização por parte dos educadores e educandos. A viabilização das atitudes que poderão favorecer tal ato é uma condição necessária para que a escola consiga cumprir com a sua função social de garantir a todos o direito à aprendizagem. Todavia, os educadores necessitam ter a convicção de como os educandos aprendem, para que, a partir daí, possam traçar suas estratégias de ensino. A resposta ao como ensinar nasce da noção exata de como os alunos aprendem.

Referências Bibliográficas

ANTUNES, Celso. Vygotysky, Quem Diria?! Em minha Sala de Aula. Petrópolis: Ed. Vozes, 2002.
ARANHA. Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: Introdução à Filosofia. 2. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1995.
ASSMAN, Hugo. Reencantar a Educação: Rumo à Sociedade Aprendente. Petrópolis: Ed. Vozes, 1998.
DEMO, Pedro. Saber Pensar. São Paulo: Cortez. Instituto Paulo Freire, 2000.
GADOTTI, Moacir. Concepção Dialética da Educação: Um Estudo Introdutório. 14. ed. São Paulo: Cortez, 2003.
MOREIRA, Marco Antônio e MASINI, Elcie, F. Salzano. Aprendizagem Significativa: A Teoria de David Ausubel. São Paulo: Editora Moraes, 1982.
SALVADOR. César Coll. Aprendizagem Escolar e Construção do Conhecimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
VASCONCELLOS. Celso dos Santos. Construção do Conhecimento em Sala de Aula. São Paulo: Libertad, 2000.

sábado, 5 de dezembro de 2009

O valor da formação

O Homem é um sujeito que produz a história e se produz no mesmo momento em que se dá esta produção. Ele é sujeito histórico por natureza capaz de trabalho que, por isso, interfere na realidade desenvolvendo a sua própria capacidade de pensar e gerar conhecimento. Trabalho, realidade e conhecimento, são categorias que se interligam e se realizam através do homem enquanto aquele capaz de constituir-se como sujeito da reflexão e da ação. Assim, o formar-se vincula-se à necessidade natural do homem de apropriar-se da realidade que o cerca com um fim transformador. O valor da formação encontra-se aí. Ao formar-se o indivíduo assume consigo mesmo o compromisso de caminhar no sentido de se apropriar do conhecimento para poder melhor refletir sobre a realidade. O conhecimento configurar-se-ia assim, como o instrumento que possibilitaria o debruçar-se sobre a realidade para que ela se descortinasse. O processo de formação é inerente ao ser humano e, por ser processo, é contínuo e avança vida a fora, não restringindo-se aos bancos acadêmicos. O Homem, sujeito em construção, é também sujeito em formação, inconcluso e incompleto. Sujeito que, capaz de reflexão, procura completar-se refazendo caminhos que, por percorridos, precisam ser revistos como condição necessária para estabelecer-se transformações.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Escola, lugar do ócio

Scholé, palavra grega que designa “lugar do ócio”. Palavra que deu origem àquela que, ao se traduzir, transformou-se em Escola. Relação necessária estabelece-se, então, entre escola e ócio. Não ao ócio como é concebido hoje: sinônimo de desocupação e do ato de não fazer nada. Pelo contrário. De acordo com os gregos o ócio é o tempo necessário para o desenvolvimento da reflexão e da capacidade de pensar. Para que o pensamento evolua por meio de elaborações mentais mister se faz o tempo livre que se transfigura em tempo produtivo. Tempo tão necessário para brotar a pergunta, o questionamento. Não há como dissociar o processo de construção do conhecimento da capacidade de se pronunciar a pergunta. Vivenciamos, desta forma, um paradoxo. O homem necessita do tempo como aliado, não como inimigo. Ele necessita de estar com o tempo na condição de sujeito e não sob ele na condição de objeto. Tudo ao contrário daquilo que se manifesta nestes dias ditos pós-modernos. O homem se submete ao tempo que o rouba dele mesmo vivenciando muito mais a sua falta do que sua condição de infinitude, mesmo considerando que a vida humana é finita.

Escola enquanto lugar do ócio, espaço e tempo. Eis a pauta da reflexão. A escola contemporânea organiza seu tempo ao redor de um espaço em função daquilo que historicamente se consolidou. Salas de aula, carteiras distribuídas, alunos enfileirados, professor ao centro, manuais didáticos, tempos de aula definidos e delimitados pelo som da sineta... Assim ela constitui-se. Na rigidez da estrutura não há tempo para se fazer uso do tempo fora daquele que previamente já se estabeleceu. Onde se encontra, na escola, o tempo destinado ao pensar livre? Naquele minuto em que o professor permite a pergunta? Nos intervalos entre uma aula e outra? Nose seus corredores e pátios? Às vezes, sim. Mas seria suficiente? O pensar assumiria, assim, o rigor da reflexão? Pode-se afirmar que não!

Desta maneira, considerando a realidade da maioria de nossas escolas tal como ela se manifesta hoje, não podemos caracterizá-las como o espaço do ócio, porque nelas o tempo cronometra-se e o direcionamento das atividades não permite que a hora livre se estabeleça. Se estabeleça para dar espaço à pergunta que, feita, possibilita o desenvolvimento cognitivo. Quando crianças, cotidianamente perguntamos. Nossa curiosidade aguçada se delineia nos “como”, “por quês”, “o quês”, tão comuns nesta fase de descobertas. Segue a vida e desta capacidade nos distanciamos. Sufocamos nossa curiosidade porque o valor concedido à pergunta é inverso e proporcionalmente inferior ao valor dado à resposta. Pergunta quem não sabe e não aquele que deseja saber, assim como responde aquele que, por ser dono do saber, credencia-se para tanto.

Aonde está a responsabilidade da escola neste contexto? Em que medida ela tem se tornado mais repressora do que estimuladora do ato de perguntar? A que distância está a escola atual daquela grega, a scholé? (Não em forma e conteúdo literalmente manifestos, mas no trato com o pensar).

Perguntas para serem respondidas. Porque só elas possibilitam a reflexão tão necessária para desencadear o processo de continuidade-ruptura que permitirá o nascimento do novo.